segunda-feira, 29 de agosto de 2011

Educar para serem “águias” e não apenas “galinhas”


Carta aos alunos da Escola de Ensino Médio Dona Luiza Timbó
Tamboril, 24 de agosto de 2011
Queridos alunos,

Eu sei bem como esses últimos dias têm sido difíceis e um pouco confusos para vocês. Imagino como devem estar angustiados em relação às aulas que não estão ocorrendo e de que forma isso pode interferir em seus processos de aprendizagem durante esse semestre. Eu também já fui aluna, melhor, aluna de escola pública e compreendo o que vocês estão passando.
Lembro que quando cursava o ensino fundamental na Escola Dona Luiza Timbó, lá pelos meados dos anos 80, houve uma inesquecível greve de professores, onde os meus saudosos mestres passaram a aderir à luta junto às demais escolas da rede estadual de ensino. Foram momentos difíceis, principalmente para eles que buscavam adquirir direitos, mesmo vivendo em uma ditadura.
Hoje, meus amigos, diga-se de passagem, estamos lutando tão somente pela permanência do que já foi conquistado, a duras penas, por aqueles que nos servem atualmente de exemplo. Conquistas estas que o nosso excelentíssimo governador insiste em destruir.
Fico pensando nas aulas que vocês estão deixando de assistir. Aquelas mesmas, que tantas vezes não faziam sentido para muitos. Tento avaliar até que ponto a falta, neste momento, dessas aulas podem interferir de maneira negativa em seus futuros. E mais uma vez me recordo da experiência que tive quando era aluna dessa escola: passei, juntamente com meus colegas, dias e mais dias sem aula, porque meus professores estavam em greve. Hoje sou professora de vocês! Concursada, graduada e com especialização na minha área.
Senti que nós devíamos aderir a essa greve por eles, que nos ensinaram a não baixar a cabeça perante as injustiças.
“Por que se chamavam homens,
Também se chamavam sonhos,
E sonhos não envelhecem”  (Clube da Esquina Nº 2 – Lô Borges)

Também pelos colegas professores que estão na capital lutando ferozmente, acampando em frente à casa dos nossos governantes, suplicando pela reabertura das negociações. Muitos até já levaram spray de pimenta nos olhos, enquanto nós estamos aqui, de certa forma confortáveis.
Devíamos essa adesão, principalmente a vocês, alunos e alunas que por várias vezes nos ouviram pregar o quanto as injustiças e toda forma de opressão deveria ser repudiada. Ouviram da nossa boca que a união faz a força, e que a família sempre foi e será a base de tudo que seremos. Assim, não poderíamos nos calar diante de tudo isso, não poderíamos ficar, como na música “Rosa dos Ventos” de Chico Buarque, a tirar leite de pedras e murmurar entre as pregas, não poderíamos ficar como seres inanimados que permanecem alheios a tudo que acontece ao seu redor. Como disse Martin Luther King: "o que me incomoda não é o grito dos maus e sim o silêncio dos bons".
Tínhamos que fazer algo diante dessa situação. Tínhamos que lutar e sonhar que uma realidade melhor poderia ser alcançada! Como nas palavras de Paulo Freire “Ai daqueles que pararem com sua capacidade de sonhar, de invejar sua coragem de anunciar e denunciar. Ai daqueles que, em lugar de visitar de vez em quando o amanhã pelo profundo engajamento com o hoje, com o aqui e o agora, se atrelarem a um passado de exploração e de rotina”.
Aderimos a essa greve porque, também como professores, assumimos o dever de educar e essa missão vai além da sala de aula, além de conteúdos formais. Para Paulo Freire “Aos professores, fica o convite para que não descuidem de sua missão de educar, nem desanimem diante dos desafios, nem deixem de educar as pessoas para serem “águias” e não apenas “galinhas”. Assim, estamos, por meio dessa greve, também educando ao mostrar que temos que lutar por nossos direitos, por um mundo melhor, por uma educação de qualidade para todos, por melhores condições de trabalho e pela valorização dos profissionais da educação.
Olhando agora para trás, percebo o quanto fomos unidos ao tomar essa difícil decisão. Somos apenas cinco professores efetivos, onde três ainda se encontram no probatório. Mas a garra mesmo veio dos temporários. Vinte e dois guerreiros pondo muita coisa em risco! Mas não podia ser diferente.
Essa é a hora mais difícil de todas: quando voltar? Como voltar? Ontem ouvi uma companheira ler uma carta que recebeu do Padre Gel.  A carta era emocionante e linda! Mas de tudo que nela estava escrito o que mais me marcou foi isto: que se for necessário voltar, pois que voltem com dignidade.
Professora Rita Maria Vale Coriolano

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