Invertendo o tempo
O que você faz hoje pode afetar o que aconteceu ontem.
Esta é a conclusão de um experimento mental de física quântica
descrito em um artigo que acaba de ser colocado no servidor de
pré-impressão arXiv, da Universidade de Cornell.
É algo que soa impossível, e de fato parece violar um dos princípios
mais fundamentais da ciência - a causalidade.
Mas os pesquisadores afirmam que as regras do mundo quântico
conspiram para preservar a causalidade "escondendo" a influência de
escolhas futuras até que essas escolhas sejam realmente feitas.
Para descobrir isso, segundo eles, basta olhar o Universo não como um
ambiente 3D normal, mas em 4D, onde as três dimensões espaciais recebem
a companhia do tempo, compondo o espaço-tempo.
E, por mais estranho que possa parecer, as influências reversas
parecem estar na agenda dos físicos já há algum tempo. Recentemente,
eles defenderam que o futuro do Universo pode estar influenciando o presente,
embora digam também que a natureza é decididamente imprevisível.
Ação fantasmagórica à distância
No coração da ideia está o fenômeno quântico da "não-localidade", no
qual duas ou mais partículas existem em estados inter-relacionadas,
entrelaçados, que permanecem indeterminados até que se faça uma medição
em um deles.
Uma vez que a medição seja feita em uma das partículas, o estado da
outra partícula é instantaneamente fixado, não importando o quão longe
ela esteja da primeira.
Albert Einstein chamou isto de "ação fantasmagórica à distância" quando, em 1935,
ele argumentou que isso significava a teoria quântica deveria estar
incompleta.
Experimentos modernos confirmaram que essa ação instantânea é, de
fato, real, e hoje ela é explorada pela criptografia e pela computação quântica.
Yakir Aharonov e seus colegas estão agora propondo um experimento que
deverá ser feito com um grupo grande de partículas entrelaçadas.
Eles argumentam que, sob certas condições, a escolha feita pelo
experimentador quanto à medição dos estados das partículas pode afetar
os estados em que as partículas se encontravam no passado.
4D, em vez de 3D
O fenômeno inusitado, segundo eles, pode ser confirmado fazendo
previamente uma medição fraca, que não altere esses estados.
O que acontece, segundo eles, é que a medição fraca antecipa a
escolha feita pelo experimentador na sua medição para valer, a medição
forte, que só será feita mais tarde.
O elemento fundamental do trabalho é ver as correlações entre as
partículas no espaço-tempo 4D, e não no espaço 3D.
Esta é uma forma de pensar sobre o entrelaçamento quântico que os
físicos chamam de "formalismo vetorial de dois estados".
"Em três dimensões, o fenômeno parece uma influência milagrosa entre
duas partículas distantes. No espaço-tempo como um todo, é uma interação
contínua que se estende entre eventos passados e futuros," explica
Avshalom Elitzur, coautor do estudo.
Medições fracas
A demonstração de tudo isso na prática - já há equipes trabalhando no
experimento real - depende das medições fracas, que, ao contrário das
medições tradicionais de fenômenos quânticos, não altera as partículas
sendo medidas.
A teoria da medição fraca estabelece que é possível medir
"fracamente" - ou "cuidadosamente" - um sistema quântico e obter algumas
informações sobre uma propriedade (por exemplo, a posição) sem
perturbar a propriedade complementar (o momento).
Embora a quantidade de informação obtida para cada medição fraca seja
muito pequena, a média de várias medições dá uma estimativa exata da
medição final da propriedade, sem distorcer aquele valor final.
No experimento agora proposto, os resultados dessas medições fracas
batem com os resultados das medições fortes feitas posteriormente.
E é só durante a medição forte que o experimentador escolhe
livremente o que medir, ainda que o estado das partículas esteja
indeterminado após as medições fracas.
"Uma partícula entre as duas medições possui os dois estados
indicados tanto pelo passado quanto pelo futuro," diz Elitzur.
Causa e efeito quânticos
A interpretação é que apenas adicionando informações posteriores,
obtidas pelas medições fortes, pode-se revelar o que as medições fracas
"realmente" significavam.
A informação já estava lá, mas de forma "criptografada" e somente
revelada em retrospecto.
Assim, a causalidade é preservada, mesmo que não exatamente como nós
normalmente pensamos em causa e efeito.
Por que existe essa censura é algo que ainda não está claro, a não
ser a partir de uma perspectiva quase metafísica.
"Sabemos que a natureza é exigente quanto a nunca parecer
inconsistente," diz Elitzur. "Assim, ela não vai apreciar nada como uma
causalidade retrospectiva evidente - as pessoas matando seus avós e
assim por diante."
Elitzur diz que alguns especialistas em óptica quântica já
manifestaram interesse em realizar o experimento em laboratório, o que
ele acha que não deve ser mais difícil do que estudos anteriores de
entrelaçamento.
Fonte: Inovação tecnológica
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