Pesquisadores do Instituto de Física e Tecnologia de Moscou (Rússia), em colaboração com cientistas dos EUA e da Suíça, inverteram o tempo em um experimento quântico.
O que eles fizeram foi devolver o estado de um computador
quântico uma fração de segundo ao passado.
Os cientistas também calcularam a probabilidade de um
elétron no espaço interestelar vazio viajar espontaneamente de volta ao seu
passado recente – descobrindo que isso ocorreria apenas uma vez em toda a
história do universo.
“Este é um de uma série de artigos sobre a possibilidade de
violar a segunda lei da termodinâmica. Essa lei está intimamente relacionada
com a noção da flecha do tempo que postula a direção unidirecional do tempo, do
passado para o futuro”, disse o principal autor do estudo, Gordey Lesovik.
Segunda lei da termodinâmica
A maioria das leis da física não faz distinção entre o
futuro e o passado. Tomemos como exemplo uma equação que descreve a colisão e o
rebote de duas bolas de bilhar idênticas. Se um close desse evento for gravado
com uma câmera e reproduzido ao contrário, ele ainda pode ser representado pela
mesma equação.
No entanto, imagine gravar uma bola branca batendo em uma
pirâmide de bolas de bilhar que se espalham em todas as direções. Nesse caso, é
fácil distinguir o cenário da vida real da reprodução reversa.
Afora nossa compreensão da segunda lei da termodinâmica, que
determina que um sistema isolado permaneça estático ou evolua sempre para o
caos, a maioria das outras regras da física não impede que as bolas de bilhar
sejam “remontadas” em uma pirâmide, ou que um chá infundido retorne ao
saquinho, ou que a lava retorne a um vulcão.
Esses fenômenos não são observados no mundo real porque
exigiriam que um sistema isolado assumisse um estado mais ordenado sem qualquer
intervenção externa, o que supostamente contraria essa segunda lei.
Elétron de volta ao passado
Os físicos quânticos de Moscou decidiram verificar se o
tempo poderia se inverter espontaneamente, pelo menos para uma partícula
individual e por uma pequena fração de segundo. Isto é, em vez de bolas de
bilhar, eles examinaram um elétron solitário no espaço interestelar vazio.
“Suponha que o elétron esteja localizado quando começamos a
observá-lo. Isso significa que temos certeza sobre sua posição no espaço. As
leis da mecânica quântica nos impedem de conhecê-la com absoluta precisão, mas
podemos delinear uma pequena região onde o elétron está localizado”, disse um
dos autores do estudo, Andrey Lebedev.
A evolução do estado do elétron é governada pela equação de
Schrödinger. Embora não faça distinção entre o futuro e o passado, a região do
espaço que contém o elétron se espalha muito rapidamente. Ou seja, o sistema
tende a se tornar mais caótico, e a incerteza da posição do elétron cresce.
Isso é análogo à crescente desordem em um sistema de grande escala – como em
uma mesa de bilhar – devido à segunda lei da termodinâmica.
“No entanto, a equação de Schrödinger é reversível”, explica
Valerii Vinokur, outro autor do artigo, do Argonne National Laboratory, nos
EUA. “Matematicamente, isso significa que sob uma certa transformação chamada
conjugação complexa, a equação descreverá uma ‘mancha de elétron’ localizada no
passado em uma pequena região do espaço no mesmo período de tempo”.
Por que não vemos isso no cotidiano?
Embora esse fenômeno não seja observado na natureza,
teoricamente poderia acontecer devido a uma flutuação aleatória no fundo de
micro-ondas cósmico que permeia o universo.
A equipe então resolveu calcular a probabilidade de observar
um elétron localizando-se espontaneamente em seu passado recente.
Os cientistas descobriram que, durante toda a vida do
universo – 13,7 bilhões de anos -, mesmo observando 10 bilhões de elétrons
recém-localizados a cada segundo, a evolução inversa espontânea do estado da
partícula só aconteceria uma vez. Além disso, o elétron não viajaria mais do
que um décimo de bilionésimo de segundo no passado.
Fenômenos de larga escala envolvendo bolas de bilhar retornando
à uma pirâmide e vulcões impelindo lava obviamente se desdobrariam em escalas
de tempo muito maiores e apresentariam um número impressionante de elétrons e
outras partículas. Isso explica por que não observamos pessoas idosas ficando
mais jovens na vida real.
Experimento com computação quântica
Por fim, os pesquisadores tentaram reverter o tempo em um
experimento de quatro estágios. Em vez de um elétron, eles observaram o estado
de um computador quântico feito de dois e mais tarde três elementos básicos
chamados de qubits supercondutores.
No estágio 1, cada qubit foi inicializado no estado
fundamental, denotado como zero. Essa configuração altamente ordenada
correspondia a um elétron localizado em uma região pequena (ou bolas de bilhar
antes de serem estouradas).
No estágio 2, conforme o elétron foi espalhado por uma
região cada vez maior do espaço, ou a pilha de bolas foi quebrada na mesa de
sinuca, o estado dos qubits se tornou um padrão cada vez mais complexo de zeros
e uns.
No terceiro estágio, um programa especial modificou o estado
do computador quântico de tal forma que evoluiu “para trás”, do caos para a
ordem. Esta operação é semelhante à flutuação aleatória de fundo de micro-ondas
no caso do elétron, mas, desta vez, foi deliberadamente induzida.
No quatro e último estágio, o programa de evolução do
segundo estágio foi rodado novamente. Se o estágio 3 foi bem-sucedido, o resultado
visto não foi o caos, mas sim uma rebobinagem do estado dos qubits de volta ao
passado, como um elétron sendo localizado em um ponto no passado ou bolas de
bilhar retrocedendo suas trajetórias.
Resultados
Os pesquisadores descobriram que, em 85% dos casos, o
computador quântico de dois qubits de fato retornou ao estado inicial.
Quando três qubits estavam envolvidos, mais erros
aconteceram, resultando em uma taxa de sucesso de aproximadamente 50%.
Segundo os autores, esses erros se devem a imperfeições no
computador quântico. À medida que dispositivos mais sofisticados forem criados,
essa taxa de erro deve cair.
Curiosamente, o próprio algoritmo de inversão de tempo pode
ser útil para tornar os computadores quânticos mais precisos. “Nosso algoritmo
pode ser atualizado e usado para testar programas escritos para computadores
quânticos e eliminar erros”, concluiu Lebedev.
A pesquisa foi publicada na revista científica Scientific
Reports. [Phys]
Fonte: https://hypescience.com/fisicos-invertem-o-tempo-usando-um-computador-quantico/
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